Eduardo Galvão, analista político e professor de relações institucionais do Ibmec Brasília, fala sobre os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Para ele, as instituições e os poderes foram testados e conseguiram passar por essa “tormenta”. O analista avalia que foi uma sinalização de que as instituições democráticas são fortes e resilientes.
Galvão afirma ainda que há uma divisão entre os que acreditam que houve uma tentativa de golpe de estado e os que acham que foi apenas uma baderna. Divisão na sociedade e também entre os historiadores. Com isso, ele conclui, há um longo trabalho a ser feito até que saibamos como essa história será contada e qual narrativa será adotada nas escolas.
(José Carlos – Rádio Nacional) Professor, o que mudou no país depois do 8 de janeiro? A democracia, foi afetada de alguma forma?
Eduardo Galvão: A gente pode falar de algumas mudanças tanto institucionais, quanto também sociais. Na parte institucional, acho que vale a pena a gente destacar que, desde os atos de 8 de janeiro do ano passado, foram aprovadas leis antiterrorismo justamente para coibir esse tipo de ação e evitar que tenhamos episódios como esse no futuro. Houve também bastante transformações sociais. Houve um aumento do interesse pela política, da participação cívica. Eu acredito que vale também a gente destacar como as instituições e os poderes da nossa República foram testados e conseguiram passar por essa tormenta. Então, isso é uma grande sinalização de que a nossa democracia, não só está consolidada, como também as nossas instituições democráticas são muito fortes e muito resilientes.
(José Carlos – Rádio Nacional) O que os brasileiros aprenderam com o ocorrido há um ano?
Eduardo Galvão: A gente pode falar aqui da polarização. Essa polarização é extremada, né? É importante que se diga isso, porque polarização e democracia é algo natural, né? O problema é radicalização dessa polarização. Então, um dos aprendizados é como essa polarização pode destruir famílias, destruir relacionamentos, né? Colocar a nossa democracia em risco e trazer grandes danos ao nosso patrimônio, não só histórico, mas também da nossa cultura. Então, eu vejo esses como alguns dos grandes aprendizados. Mas outros também principalmente, relacionados às mídias e às redes sociais. Nós podemos testemunhar, como que a desinformação, a informação equivocada, fake news, podem gerar ódio, desencadear eventos trágicos, agressões, até mesmo homicídios. Então é muito importante esse aprendizado de qual é o papel e qual a responsabilidade dessas plataformas, na veiculação de notícias notadamente fake news.
(José Carlos – Rádio Nacional) Professor, na sua opinião, o que deve ser feito para que atos como de oito de janeiro não voltem a acontecer?
Eduardo Galvão: Houve esse reforço institucional, na aprovação dessas leis que eu mencionei. Houve ainda um reforço na segurança dos prédios públicos dos Três Poderes, principalmente no Supremo Tribunal Federal, onde houve a maior depredação. Mas acredito que ainda há um grande processo pela frente. Um processo de amadurecimento da nossa participação política, isso eu falo de todos os cidadãos, e um amadurecimento sobre como a nossa democracia é importante e como ela é frágil. Instituição democracia é algo que a gente precisa cuidar dia a dia. Acredito que essa proximidade de uma tentativa de golpe de estado trouxe à memória dos brasileiros mais novos, que não viveram o período da ditadura militar, trouxe essa percepção de como é vulnerável a nossa democracia e como nós precisamos atuar como cidadãos, aumentando a nossa participação cívica, aumentando o nosso diálogo – isso eu falo em relação a cidadãos, em relação a políticos, em relação a partidos também, para que a gente possa conviver numa sociedade plural, numa democracia, em que há diversidade. Essa diversidade não só é natural, como é desejável, mas que a gente possa aprender a conviver de maneira pacífica, respeitando as diferentes visões de mundo e as diferentes formas de pensar.
(José Carlos – Radio Nacional) E de que forma o senhor acha que o ensino brasileiro deve tratar do assunto nas escolas?
Eduardo Galvão: Essa questão é bastante sensível, porque há uma diferença de narrativa, uma diferença de compreensões sobre o que aconteceu no oito de janeiro. Há uma boa parcela da população que acredita que, de fato, houve depredação dos prédios públicos, houve um atentado à democracia e houve o risco de um golpe de estado. Há outra parcela, também considerável da população, que não acredita na ideia de uma tentativa de golpe de estado, que acredita que houve, sim, depredação dos prédios públicos, mas que isso deveria ser considerada apenas como uma baderna. Não acreditam que, de fato, tenha havido um atentado à democracia e um risco de golpe de estado. Então, o próprio setor educacional e os historiadores, ainda também se dividem em relação a como essa história é contada. Justamente porque, como eu te falei, há uma divisão muito clara no Brasil das percepções sobre os atos de oito de janeiro do ano passado. Então, acredito que ainda há um trabalho longo ainda para ser feito e instituído pelos historiadores de como essa história será contada e de qual narrativa será de fato adotada pelo ensino.