À margem do II Seminário Nacional de Saúde Mental no Desporto de Alta Competição, que se realizou no Estoril, com organização da Associação de Atletas Olímpicos de Portugal (AAOP), Évora disse que se tem “de mudar essa forma de ver” as questões mentais.
“Normalmente o processo de quem sonhou e não conseguiu chegar aos seus sonhos sofre frustrações, preocupações e muitas outras coisas que afetam a saúde mental. Um atleta quando atinge o palco máximo e chega lá em cima sofre essas e mais algumas, pelo facto de ser um alvo. Tudo o que diz, o que representa, seja para bem ou mal, acaba por ser um alvo a abater”, referiu à agência Lusa.
Para Nelson Évora, este “é um sentimento estranho, mas é real e afeta de uma forma muito profunda a saúde mental dos atletas de topo”, assumindo que os atletas têm “de ser bons gestores” da própria vida e carreira.
“Temos um dia específico da nossa vida que temos de estar no nosso melhor e temos problemas associados à nossa profissão. Não é só saltar, as relações interpessoais também afetam muito e temos de gerir isso tudo. Na verdade, um grande atleta é um grande gestor. Devíamos receber, pelo menos aqui em Portugal, como um grande gestor, porque temos de gerir tantas coisas da nossa vida pessoal, da nossa vida desportiva, e ao mesmo tempo temos de nos preparar mentalmente para grandes palcos, para grandes competições, grandes críticas”, referiu.
Nelson Évora lamentou ainda ser de uma geração que não tinha acesso a cuidados de saúde mental, algo que considera “extremamente importante, tal como treinar, descansar, competir ao mais alto nível, ser consistente”.
“A saúde mental acaba por ser mais importante do que alguns destes ingredientes, que são a base de sucesso de qualquer atleta”, assumiu.
Durante uma das mesas do II Seminário Nacional de Saúde Mental no Desporto de Alta Competição, Nelson Évora disse que esse apoio poderia ter “poupado algumas cicatrizes”, assumindo que começou a fazer terapia em 2016.
O campeão olímpico em Pequim2008 considerou que, caso o seu antigo treinador João Ganço, também tivesse tido terapia, se calhar não se teriam separado, porque havia falhas na comunicação, que para Évora “é crucial”.
“O segredo das minhas medalhas é que estávamos no melhor momento da nossa comunicação”, assumiu.
A varista Marta Onofre também esteve presente no evento e admitiu que vai terminar a sua carreira para o próximo ano, por ter vontade de terminar a carreira ainda num palco mundial, após lesões terem afetado o seu rendimento desde os Jogos Olímpicos Rio2016, únicos em que conseguiu estar.
“Quando terminamos a carreira, sentimos um grande vazio. Tem de se começar a preparar muito mais cedo”, salientou.
Licenciada em medicina, Marta Onofre referiu que a conciliação entre curso e o desporto de alto rendimento nem sempre foi fácil, com muitos obstáculos pelo caminho, com o finalizar da especialização e vontade de ser mais vezes mãe — gerir a maternidade é uma das grandes dificuldades das atletas — a levarem à decisão de terminar a carreira.